Um dos grandes entraves presentes nas discussões sobre
Currículo, principalmente entre professores, é
que muitos consideram que este é um assunto meramente
administrativo, portanto, compete à administração
e, quando muito, à supervisão encaminhar tal trabalho.
Mas pensar assim compromete sobremaneira o avanço das
discussões e por conseguinte do conhecimento sobre as reais
implicações que transitam em torno do currículo,
gerando a compreensão equivocada de que currículo
significa grade curricular.
Pensar os percursos da educação implica,
necessariamente, considerar as trajetórias do currículo.
Para entender melhor esses caminhos foram criadas as Teorias do
Currículo. As primeiras a surgirem foram as Teorias
Tradicionais, que tiveram sua origem na década de 1920 nos
EUA, tendo em Bobbit e depois em Tyler seus principais
representantes. Ambos empreenderam ao currículo um caráter
meramente técnico e inteiramente voltado para a organização.
A divisão tradicional das atividades educativas nas formas de
currículo, ensino, instrução e avaliação
é decorrente dessas teorias. O enfoque central das Teorias
Tradicionais era o “como fazer o currículo”.
Já as Teorias Críticas emergem na década
de 1960 num período tumultuado e repleto de acontecimentos
marcantes que influíram diretamente no currículo. Esse
conjunto de teorias busca compreender “o que o currículo
faz”. E nessa busca aparecem diversos movimentos de grande
importância. Alguns com teorizações mais gerais,
outros com pressupostos mais específicos da educação
e do currículo. Nesse contexto, o “Currículo
Oculto” merece destaque devido a sua importância,
especialmente no início de formação das Teorias
Críticas. Ele diz respeito à distribuição
implícita de normas, valores e tendências que se
consolidam na vida dos alunos devido às rotinas institucionais
das escolas feita dia após dia, durante anos. Nas teorias
críticas não se negam as relações de
poder, mas tais relações ocorrem de maneira
centralizada. Essas teorias desconfiam, questionam e defendem a
transformação radical.
As Teorias Pós-críticas do currículo
surgem, também, na década de 1960, mas sua visibilidade
no país é recente. Elas apontam para o momento no qual
nos encontramos. Destacam os novos traçados que perpassam a
cultura, a identidade e o poder (descentralizado). Essas teorias
questionam “o currículo para quem”. A noção
de construção social perpassa os Estudos Culturais das
Teorias Pós-críticas.
O que separa as terias tradicionais das teorias críticas e
pós-críticas é a questão do poder. As
teorias tradicionais mostram-se neutras e desinteressadas. Em
contrapartida, as teorias críticas e pós-críticas
argumentam que nenhuma teoria é neutra ou desinteressada; ela
está mesmo é implicada em relações de
poder.
Dessa maneira, o processo ensino-aprendizagem passa a ser ancorado na
realidade sócio-cultural dos educandos, para que ocorra uma
aprendizagem verdadeiramente significativa, em oposição
à aprendizagem mecânica e efêmera.
No que diz respeito aos Componentes Curriculares (O que...
Quando... e Como ensinar e avaliar), é necessário
que conheçamos primeiramente um pouco de suas estruturas
conceituais para daí então estabelecer um diálogo
com a prática pedagógica levada a termo neste trabalho.
O que ensinar ou a concretização das intenções
educativas pressupõe a realização de seleções
e como elas serão concretizadas no cotidiano pedagógico.
Daí decorre a necessidade de uma formulação
adequada, ancorada na realidade, para orientar a ação
docente. Uma vez selecionadas as intenções educacionais
e definida a forma para encaminhar as ações pedagógicas
é necessário organizá-las e seqüenciá-las
em um tempo o mais adequado possível para que sejam atingidas.
Ao mesmo tempo, é preciso prever uma avaliação
que possibilite averiguar se a ação pedagógica
é condizente com as intenções desejadas.
O grande nó ou encruzilhada que encontramos nos currículos
é passar das intenções educativas à
concretização dos objetivos educacionais, tendo uma
prática pedagógica suficientemente eficaz para guiar de
maneira coerente e adequada, as intenções educativas.
Portanto, para organizar as intenções educacionais
tendo como base “quando ensinar” é fundamental que a
escola reformule seu tempo, o que implica diretamente a reformulação
do tempo no currículo. É preciso prever tempo para
pensar individual e coletivamente sobre o tempo escolar em seus
múltiplos aspectos, entre eles o tempo do conhecimento dos
(as) alunos (as), como também o tempo para o professor, de
modo que possibilite organizar clara e coerentemente as intenções
educacionais.
A maneira como se ensina pode fazer toda a diferença na
concretização das intenções educativas.
Não resta dúvida de que esta é uma questão
emblemática dentro do currículo e que se reflete na
escola como um todo. Percebo na escola onde trabalho que há
alguns os professores que se angustiam diante da questão “como
fazer” que pressupõe o uso de metodologias. Operacionalizar
o “como ensinar” na perspectiva de saber ensinar, requer um
trabalho que envolve preparação, responsabilidade,
seriedade e compromisso. “É algo que se define pelo
engajamento do educador com a causa democrática e se expressa
pelo seu desejo de instrumentalizar política e tecnicamente o
seu aluno, ajudando-o a construir-se como sujeito social” (MOYSÉS,
2001:14).
Com relação ao componente avaliação, o
mesmo pode ser considerado como uma possibilidade de mobilidade
social. Avaliar, assim, é uma atividade intrínseca e
indissociável a qualquer tipo de ação que vise a
provocar mudanças. Cabe, a nós professores, debruçar
e dirigir um olhar reflexivo sobre a avaliação e sobre
seu significado enquanto atividade humana intencional. O trabalho com
a avaliação em aula não é isolado ao
passo que está ligado diretamente a uma intenção/objetivo
que perpassa o projeto político-pedagógico, aos
objetivos de ensino e da aprendizagem e a perspectiva de formação
de sujeitos com potencial para problematizar o real, vivê-lo e
(re) criá-lo.
Assim, o que devemos avaliar? Tudo o que acontece no contexto
pedagógico, inclusive o trabalho do professor. E quando
avaliar? Em todos os momentos, pois a avaliação deve
ser permanente e processual. E como avaliar? Não há
receitas prontas, mas é preciso comprometimento e a revisão
de posturas para um (re) direcionamento da prática.
Como vemos, após esclarecermos algumas proposições
conceituais acerca dos componentes curriculares, far-se-á,
agora, o intercruzamento desses conceitos com a prática
pedagógica da instituição na qual atuo. É
possível perceber na escola em questão que a
organização dos componentes curriculares vem sendo mais
debatida. Parece que nos encontramos visivelmente em um tempo de
mudanças.
Não ao acaso, nos deparamos com novas referências a
orientar o pensamento dos educadores, bem como suas posturas e
práticas. Vários professores da escola levada a termo
procuram mobilizar ações e planejar sua prática
educativa com vistas a passar das intenções educativas
e concretizá-las. E pelo visto estão conseguindo. Isso
pode ser visto no estudo recente divulgado pelo MEC, o qual coloca
Santa Catarina como o estado com os melhores índices
educacionais no Ensino Médio e entre os primeiros no Ensino
Fundamental.
É claro que muito ainda precisa ser feito, mas vemos
experimentos inovadores surgindo à nossa frente que estão
dando certo. Como nos diria Rubem Alves “Que pipoquem
experimentos”. Tal realidade tem feito muitos professores deixarem
a zona de acomodação e se lançarem na pesquisa
em busca de novas possibilidades para o processo ensino-aprendizagem,
provocando a reorganização dos diferentes saberes e
fazeres pedagógicas que envolvem o ato educacional. As
constantes avaliações, inclusive as impostas
recentemente pelo ministro da educação (com cobrança
de resultados), visa a um acompanhamento mais sistemático do
vem sendo feito pela educação no país.
Vale dizer que entre os principais desafios e perspectivas no campo
do currículo hoje, encontra-se a necessidade de repensar a
escola e o seu sentido, assim como o professor e a sua prática
pedagógica. Superar modelos arcaicos, transpondo obstáculos
como a falta de participação, de consideração
para com a cultura do coletivo escolar faz parte do conjunto de
desafios a serem enfrentados. Entender o currículo como
proposta feita de percursos que se entrecruzam é tarefa para
todos e para bastante tempo. Mas a medida desse tempo também
pode ser determinada pelas nossas iniciativas.
(Fabrício Sprícigo)
(Fabrício Sprícigo)