As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia,
consubstanciadas nos Pareceres CNE/CP n. 05/2005, 01/2006 e na
Resolução CNE/CP n. 01/2006, demarcam novo tempo e apontam para novos
debates no campo da formação do profissional da educação no curso de
pedagogia, na perspectiva de se aprofundar e consolidar sempre mais as
discussões e reflexões em torno desse campo.
Esse aprofundamento exige, no entanto, que se delineiem de forma mais
clara e precisa os contornos e as perspectivas que essa formação poderá
assumir em decorrência das diretrizes aprovadas.
As DCN-Pedagogia definem a sua destinação, sua aplicação e a
abrangência da formação a ser desenvolvida nesse curso. Aplicam-se: a)
à formação inicial para o exercício da docência na educação infantil e
nos anos iniciais do ensino fundamental; b) aos cursos de ensino médio
de modalidade normal e em cursos de educação profissional; c) na área
de serviços e apoio escolar; d) em outras áreas nas quais sejam
previstos conhecimentos pedagógicos. A formação assim definida
abrangerá, integradamente à docência, a participação da gestão e
avaliação de sistemas e instituições de ensino em geral, a elaboração,
a execução, o acompanhamento de programas e as atividades educativas
(Parecer CNE/CP n. 05/2005, p. 6).
Abre-se, assim, amplo horizonte para a formação e atuação profissional
dos pedagogos. Tal perspectiva é reforçada nos artigos 4º e 5º da
Resolução CNE/CP n. 01/2006, que definem a finalidade do curso de
pedagogia e as aptidões requeridas do profissional desse curso:
Art. 4º - O curso de Licenciatura em pedagogia destina-se à
formação de professores para exercer funções de magistério na Educação
Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de
Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional, na área
de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos
conhecimentos pedagógicos.
Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem
participação na organização e gestão de sistemas e instituições de
ensino, englobando:
I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas próprias do setor da Educação;
II - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas não-escolares;
III - produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do
campo educacional, em contextos escolares e não-escolares.
Delineia-se, pois, que a formação no curso de pedagogia deverá
assegurar a articulação entre a docência, a gestão educacional e a
produção do conhecimento na área da educação. Com essa explicitação, o
legislador afasta a possibilidade de redução do curso a uma formação
restrita à docência das séries iniciais do ensino fundamental,
aproximando-se, dessa forma, das propostas de diretrizes apresentadas
pela Comissão de Especialistas de Pedagogia de 1999. Todavia, faz-se
necessário demarcar a compreensão desses elementos constitutivos da
formação do pedagogo.
A docência nas DCN-Pedagogia não é entendida no sentido restrito do ato
de ministrar aulas. O sentido da docência é ampliado, uma vez que se
articula à idéia de trabalho pedagógico, a ser desenvolvido em espaços
escolares e não-escolares, assim sintetizado no Parecer CNE/CP n.
05/2005 (p. 7):
Entende-se que a formação do licenciado em pedagogia fundamenta-se
no trabalho pedagógico realizado em espaços escolares e não-escolares,
que tem a docência como base. Nesta perspectiva, a docência é
compreendida como ação educativa e processo pedagógico metódico e
intencional, construído em relações sociais, étnico-raciais e
produtivas, as quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da
pedagogia.
Dessa forma, a docência, tanto em processos educativos escolares
como não-escolares, não se confunde com a utilização de métodos e
técnicas pretensamente pedagógicos, descolados de realidades históricas
específicas. Constitui-se na confluência de conhecimentos oriundos de
diferentes tradições culturais e das ciências, bem como de valores,
posturas e atitudes éticas, de manifestações estéticas, lúdicas,
laborais. (Parecer CNE/CP n. 05/2005, p. 7)
Tomados sob essa perspectiva o trabalho docente e a docência implicam
uma articulação com o contexto mais amplo, com os processos pedagógicos
e os espaços educativos em que se desenvolvem, assim como demandam a
capacidade de reflexão crítica da realidade em que se situam. Com
efeito, as práticas educativas definem-se e realizam-se mediadas pelas
relações socioculturais, políticas e econômicas do contexto em que se
constroem e reconstroem. Nessa perspectiva, Aguiar e Melo (2005a)
afirmam:
(...) escapando aos reducionismos da visão teoricista (aplicação
instrumental da teoria na prática), e do praticismo (prioridade ao
saber tácito, construído na prática imediata cotidiana) na sala de
aula, tem-se o entendimento de que a docência é o fulcro de articulação
dos diversos conhecimentos – aportes teóricos da pedagogia e das
Ciências da Educação e de outros conhecimentos especializados e
daqueles produtos das práticas escolares e não-escolares refletidas.
Lugares onde ela se (re)produz internamente nas suas especificidades,
construindo novas alternativas de práticas pedagógicas diante de
problemáticas existentes. Neste sentido, a docência constitui uma das
mediações para a construção do discurso de síntese da pedagogia,
articulada intrinsecamente com a pesquisa. Assim, a relação
docência-pesquisa é um princípio epistemológico da prática.
Destarte, a partir do horizonte vislumbrado para a formação do
profissional da educação no curso de pedagogia, as Diretrizes
Curriculares Nacionais definem os pilares e os contornos dessa formação:
A educação do licenciado em pedagogia deve, pois, propiciar, por
meio de investigação, reflexão crítica e experiência no planejamento,
execução, avaliação de atividades educativas, a aplicação de
contribuições de campos de conhecimentos, como o filosófico, o
histórico, o antropológico, o ambiental-ecológico, o psicológico, o
lingüístico, o sociológico, o político, o econômico, o cultural. O
propósito dos estudos destes campos é nortear a observação, análise,
execução e avaliação do ato docente e de suas repercussões ou não em
aprendizagens, bem como orientar práticas de gestão de processos
educativos escolares e não-escolares, além da organização,
funcionamento e avaliação de sistemas e de estabelecimentos de ensino.
(Parecer CNE/CP n. 05/2005, p. 6)
Como se depreende, a perspectiva que se apresenta para o curso de
pedagogia é de uma formação que favoreça a compreensão da complexidade
da escola e de sua organização; que propicie a investigação no campo
educacional e, particularmente, da gestão da educação em diferentes
níveis e contextos. A pesquisa, a produção do conhecimento no campo
pedagógico e o estudo das ciências que dão suporte à pedagogia e a
própria reflexão sobre a pedagogia como ciência certamente deverão
estar presentes no processo formativo a ser desenvolvido nesse curso,
concomitantemente ao estudo a respeito da escola, da prática educativa
e da gestão educacional. Evidências encontradas nas DCN-Pedagogia, na
medida em que no Parecer CNE/CP n. 05/2005 (p. 6-7) está assim indicado:
Para a formação do licenciado em pedagogia é central o conhecimento
da escola como uma organização complexa que tem a função social e
formativa de promover, com eqüidade, educação para e na cidadania.
(...) Também é central, para essa formação, a proposição, realização,
análise de pesquisas e a aplicação de resultados, em perspectiva
histórica, cultural, política, ideológica e teórica, com a finalidade,
entre outras, de identificar e gerir, em práticas educativas, elementos
mantenedores, transformadores, geradores de relações sociais e
étnico-raciais que fortalecem ou enfraquecem identidades, reproduzem ou
criam novas relações de poder (...). Finalmente é central a
participação na gestão de processos educativos, na organização e
funcionamento de sistemas e de instituições de ensino, com a
perspectiva de uma organização democrática, em que a
co-responsabilidade e a colaboração são os constituintes maiores das
relações de trabalho e do poder coletivo e institucional, com vistas a
garantir iguais direitos, reconhecimento e valorização das diferentes
dimensões que compõem a diversidade da sociedade, assegurando
comunicação, discussão, crítica, propostas dos diferentes segmentos das
instituições educacionais escolares e não-escolares.
A formação proposta para o profissional da educação do curso de
pedagogia é abrangente e exigirá uma nova concepção da educação, da
escola, da pedagogia, da docência, da licenciatura. Uma nova
compreensão que situe a educação, a escola, a pedagogia, a docência, a
licenciatura no contexto mais amplo das práticas sociais construídas no
processo de vida real dos homens, com o fim de demarcar o caráter
sócio-histórico desses elementos.
O curso de pedagogia define-se como um curso de licenciatura e, neste
sentido, o mencionado Parecer explicita que a formação para o exercício
da docência nas áreas especificadas constitui um de seus pilares. Em
contrapartida, ao se compreender e definir o curso de pedagogia como
uma licenciatura, não se pode incorrer no equívoco de organizá-lo
curricularmente como um curso circunscrito ao campo das metodologias de
ensino e dos conteúdos relativos aos saberes específicos para o
exercício da docência na educação infantil, nos anos iniciais do ensino
fundamental, no curso da modalidade normal no ensino médio ou, ainda,
nos cursos de formação profissional na área da educação que começam a
se fazer presentes em nossa realidade. Até mesmo porque, como já se
destacou, também, em outros momentos, o exercício da docência
desenvolve-se no contexto mais amplo da educação, da escola e da
própria sociedade, e, sendo assim, a formação para tal exercício
profissional deve fornecer elementos para o domínio desse contexto.